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Data de Publicação 14/06/2020 - 14:15 Atualizado em 14/06/2020 - 14:18 3201 visualizações

Reportagem Especial | As faces do feminino na pandemia de Covid-19: Mulheres que desafiam o “novo normal”

Por Larissa Burchard e Sara Feitosa

Uma mulher acorda, faz o café e assiste ao telejornal. “A Organização Mundial da Saúde declara pandemia de coronavírus”, diz o apresentador. A partir daquele momento, todas as dificuldades aumentam.

Existem aquelas que trabalham e sentem uma cobrança, um dever de enfrentar a pandemia. As mães se sobrecarregam para dar conta da casa, do trabalho e dos filhos. E outras, vivem com o medo constante de morrer por conta da violência doméstica. Tudo isso faz parte do “novo normal” da vida da mulher, a pandemia aumentou ainda mais a desigualdade de gênero enfrentada há anos por elas e destacou a necessidade de discutirmos sobre o tema.

Durante esse período de isolamento, o Grupo de Trabalho “Unipampa no Enfrentamento à COVID-19” publicou no perfil do Instagram uma série sobre as “Faces do Feminino na Pandemia de Covid-19”. Nessa reportagem, você confere mais sobre as experiências e desafios de mulheres da série que trabalham para ajudar a combater as consequências da disseminação do novo coronavírus, O SARS-CoV-2, e ainda dar conta dos desafios impostos ao gênero.

Uma luta que forma muito mais que profissionais

Segundos os dados abertos fornecidos pelo Lattes – plataforma própria para pesquisadores –, dos mestres registrados na plataforma 53% são mulheres. Ao subir o nível, para pesquisadoras com doutorado, o número cai para 47%. Com uma representação constante no ambiente acadêmico, elas representam em torno de 50% das publicações cientificas do país, segundo pesquisa do Observatório Ibero-americano de Ciência, Tecnologia e Sociedade da Organização de Estados Ibero-americanos (OCTS-OEI).

Uma dessas pesquisadoras é Débora Pellegrini, 43 anos, coordenadora e professora do curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), em Uruguaiana. Débora se diz “brasileira mesmo”, pois, paulista, já morou em mais dois estados, em Minas Gerais onde fez a graduação em Veterinária, e no Rio de Janeiro quando realizou o mestrado em Saúde Pública. A pesquisadora veio ao Rio Grande do Sul quando ingressou no doutorado em Ciências Veterinárias na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e depois, em 2013, assumiu o cargo de docente na Unipampa em Uruguaiana. “Em cada lugar que vou, tenho um pedaço”, comenta.

Logo que começou a pandemia, Pellegrini foi chamada para participar do Comitê de Enfrentamento da COVID-19 do estado, representando a Unipampa. Junto com outros colaboradores, ela participa do “Estudo Epidemiológico da COVID-19 no estado do Rio Grande do Sul (EPICOVID-19/RS), coordenado pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Na pesquisa, os professores, profissionais de saúde e voluntários aplicaram testes rápidos da covid-19 na população de nove cidades gaúchas para analisar e acompanhar a disseminação do SARS-COV-2 no estado. Também atua no estudo realizado em Bagé, com o mesmo objetivo da EPICOVID-19 RS, só que em âmbito municipal, resultado de uma parceria entre a Unipampa e a prefeitura.

Além dos dois estudos, a coordenação do curso de Veterinária também entra na agenda de afazeres. Para ela, trabalhar durante a pandemia não é difícil, mas cansativo. “Na verdade, há tempos eu faço coisa para não me deixar levar, eu acho que a gente não tem que ir pro furacão e sim olhar para o furacão, mas não entrar nele”, defende.

Olhar para o furacão, segundo Débora, é não deixar que o estresse consuma a sua rotina e tentar manter a calma diante da situação. Dentre os papéis que desempenha como pesquisadora e professora, um deles é conversar e acalmar as pessoas para que o medo não tome conta. “Na real é mais um papel de acalmar, falar para as pessoas se cuidarem, porque nós temos que tentar compreender. Fazer entender que o distanciamento social é importante, porque o contato e a disseminação são diretos. É um trabalho paliativo também de explicar que a higiene e o uso da máscara são extremamente importantes”, explica Pellegrini.

Com sua experiência na área, ela esclarece que em uma epidemia o principal é dar estrutura para que as pessoas não sofram de privações como fome e desemprego. Débora estudou a vida inteira para atuar em situações de crises de saúde como a atual, por isso se mantem confiante, mesmo crítica, em relação ao futuro pós-pandemia. “Nós não vamos poder mais morar em uma sociedade tão desigual. Todos deverão ter sua casa, porque uma pessoa sem casa vai ser uma provável transmissora de vírus. Agora é um momento de pensar, é uma urgência que existe. Não vamos mais poder ter gente vulnerável como temos hoje. Todos vamos ter que ter uma condição mínima de viver. Mas eu acho que vai ser possível, eu tenho fé que a gente vai melhorar”, afirma.

A luta contra a COVID-19 não fica restringida apenas às profissionais e professoras, estudantes também estão abdicando de seu tempo para auxiliar em projetos e programas e ajudar pessoas atingidas pela pandemia. É o caso de Cristina Rocco, 28 anos, estudante de Medicina também na Unipampa, em Uruguaiana. Ela é voluntária no EPICOVID-19/RS, saindo a campo para aplicar testes rápidos, e participa do projeto de extensão “Pandemia da solidariedade” no qual dá atenção continuada a idosos, mantendo o vínculo com aqueles que já recebiam atendimentos médicos dos estudantes.

A dedicação vem da vontade de Cristina em ir além da medicina. O trabalho durante a pandemia não apenas ajuda a quem é destinado, como também contribui para sua formação relacionando a teoria com a prática e melhorando a forma como se comunica com pacientes. “A melhor parte é me sentir produtiva e contribuindo de alguma forma para ajudar pelo menos algumas pessoas, ao mesmo tempo que consigo aprimorar minha formação acadêmica, atuando em um período em que todo profissional de saúde é essencial”, explica. Ainda assim, mesmo com todo o trabalho, para Cristina a parte mais difícil é não estar dentro dos hospitais trabalhando, como muitos colegas fazem agora na linha de frente contra a Covid-19.

Ainda se formando como médica, ela acredita que como mulher tem mais cuidado e preocupação com os pacientes. “Sempre que realizo alguma atividade tento realizá-la com grande carinho, cuidado, empatia e responsabilidade. Acredito que essas são características que todos os profissionais deveriam apresentar, mas que normalmente estão mais associadas à atuação feminina. Como mulher tento lembrar meus colegas sejam homens ou mulheres que eles podem ter atitudes parecidas e até melhores que as minhas”, ressalta.

Maternidade e ciência, precisamos falar sobre isso

O lugar de mulher é onde ela quiser, mas, às vezes, esses lugares impõem mais dificuldades, como é o caso de mulheres que são mães e pesquisadoras. Para elas, durante o isolamento social, as tarefas domésticas, os cuidados com os filhos e o trabalho se misturam no mesmo ambiente, fazendo com que se sintam sobrecarregadas. Os resultados preliminares do projeto Parents in Science (Pais na Ciência), apontada pela reportagem do Uol, revela que 52% das mulheres que tem filhos não concluíram seus artigos durante o isolamento, enquanto isso 38% dos homens com filhos não terminaram suas pesquisas.

Giulia Wiggers sabe bem como é isso. Docente do curso de Fisioterapia e dos cursos de Pós-graduação em Bioquímica e Fisiologia na Unipampa, em Uruguaiana, casada e mãe no menino Enzo, uma criança com Transtorno do Espectro Autista, ela se esforça para manter o ritmo do trabalho dentro do ambiente doméstico.

Segundo a professora, na pandemia a rede de apoio com quem contava foi suspensa. Sem a escola, terapias e acompanhantes, o trabalho aumenta de maneira significativa já que é necessário sempre atender à família e suas necessidades. “O malabarismo que fazemos para realizar atividades profissionais, domésticas e cuidado com o filho é um dos maiores desafios das mulheres! O trabalho online requer um tempo de dedicação e isolamento dentro do próprio isolamento, ou seja, é necessário ficar isolada e conectada com toda a família estando também em casa. Esta não é uma realidade possível em sua plenitude para quem tem filhos e quando se tem filhos atípicos, o desafio é ainda maior”, explica.

E, no meio de tudo isso, Giulia ainda encontra tempo para lutar contra a Covid-19 por meio da ciência. Wiggers participa de três projetos de extensão criados para ajudar durante a crise atual. O projeto “Imago” reúne fotos que representam os sentimentos e as mudanças provocadas pela pandemia; já o “Produção e distribuição de máscaras faciais no combate a pandemia da Covid-19” distribuiu mais de 1700 máscaras de proteção; e o projeto “Protege-Covid” que desenvolve com o professor Frank Peçanha, construíram um equipamento de proteção adicional contra gotículas e respingos para as equipes de saúde usarem enquanto realizam procedimentos em pacientes com COVID-19.

Especialmente no “Protege-Covid”, ela e o marido, Professor Franck Peçanha, recriaram um equipamento tailandês de caixa acrílica usado para procedimentos de intubação, que oferece maior risco de contaminação aos profissionais de saúde. Juntos eles tiveram a ideia de trocar o material acrílico por canos PVC, plástico e velcro com a mesma finalidade só que mais baratos e seguros. Eles doaram o equipamento para o Hospital de Uruguaiana que já está utilizando em pacientes com Covid.

Além de serem parceiros na pesquisa, ela e o marido também procuram dividir as tarefas domésticas. “De uma maneira geral, a desigualdade de gênero está relacionada a muitos aspectos, desde culturais, religiosos, educacionais, econômicos. Porém, há um aspecto que é muito importante para a redução dessa disparidade, o esclarecimento e o entendimento de que as atividades do lar e o cuidado com os filhos devem ser partilhadas de maneira igualitária”, esclarece Giulia. Para ela, ter o parceiro junto é uma vantagem que muitas mulheres não possuem.

Reconhecendo seus limites, a professora também comenta que sendo mulher tende a se autocobrar ainda mais. Ao trabalhar durante a pandemia, percebe que a diferença de gênero aumenta e também a saúde mental acaba sendo afetada por não saber até quando a situação continuará. “Considero que está sendo um momento de reflexão. As cobranças, auto cobranças de dar conta de tudo, parece ser um “fantasma” que acompanha especialmente as mulheres, mas está sendo desconstruído de alguma maneira. Não é possível nesta situação dar conta de tudo e está tudo bem! Temos que passar por este período, e, de alguma forma, se reinventar e mudar as perspectivas”, aconselha. Com todas as situações, Giulia é uma mulher, mãe e pesquisadora que trabalha e tentar tornar o mundo mais igualitário mesmo que ele mostre o contrário.

2020: O ano da enfermagem

Você sofre um acidente e a primeira pessoa que te recebe para checar os ferimentos é uma enfermeira. Elas estão ali e são a maioria na área de saúde, representando 86% dos profissionais de enfermagem no Brasil, de acordo com a Pesquisa Perfil da Enfermagem (Cofen/Fiocruz). O cuidado em saúde pública na população brasileira passa pelas enfermeiras, já que são elas que fazem os testes rápidos, checam os sintomas, aplicam remédios e ajudam em pesquisas, correndo o risco de se contaminar.

Fernanda Morgado, 25 anos, é uma dessas enfermeiras, ela trabalha na Secretaria Municipal de Saúde e na Estratégia de Saúde da Família (ESF), em Bagé. A primeira ação que os profissionais de saúde tomaram quando a pandemia se confirmou foi orientar a população sobre as formas de prevenção e o isolamento social. Depois, Fernanda e os colegas começaram a realizar barreiras sanitárias na entrada do município da campanha, imunizações contra o vírus Influenza e a aplicação dos testes de COVID-19 para aqueles com sintomas suspeitos que chegavam à barreira.

A enfermeira também participa da pesquisa EPICOVID-19 em Bagé. Para ela, que sempre almejou trabalhar com pesquisa de campo, o mais difícil é lidar com as fake News e o medo das pessoas com o vírus, mas ela continua otimista. “Ser mulher, ser enfermeira e estar na linha de frente na guerra contra a COVID é um privilégio, grata pela importância do “ser enfermeiro” estar sendo vista por todos”, comenta Fernanda.

Em 2019, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) designaram 2020 como o ano Internacional de Profissionais de Enfermagem e Obstetrícia como uma forma de homenagear e defender melhores condições e investimentos na área. “Não poderiam estar mais certos”, comentou em entrevista a enfermeira e docente do curso de Enfermagem da Unipampa, Jenifer Harter.

Jenifer se tornou professora na Unipampa muito jovem, aos 26 anos já estava terminando o doutorado e assumindo o cargo em 2015. Hoje ela é uma das principais docentes que atua no controle da disseminação do coronavírus na região. No início da pandemia, Harter se envolveu nos serviços de saúde de Uruguaiana para organizar protocolos e fluxos com foco no atendimento aos possíveis infectados de COVID-19. Na medida que o vírus foi se espalhando, ela começou a trabalhar com Débora Pellegrini nos estudos feitos em Bagé e no estado. Atualmente, Jenifer coordena duas pesquisas em Uruguaiana, uma para estudar a prevalência de COVID-19 em profissionais da Rede de Atenção da Saúde e outra para monitorar pacientes com Síndrome Gripal na cidade.

Como professora, o trabalho durante o isolamento é o mais difícil. Jenifer percebe que construir pesquisas a distância é mais dificultoso, pois o contato pessoal aproxima as pessoas e os pesquisadores. “Sempre fui adepta do “olho no olho”, acredito que encontros aproximam e integram as pessoas envolvidas no trabalho e na pesquisa. Sinto saudades da sala de aula e das práticas com discentes no hospital, mas compreendo que apesar de difícil é necessário e é uma das poucas medidas que podemos adotar em meio a pandemia.”, desabafa.

Como enfermeira, para ela é difícil ver o número crescente de casos e óbitos na região. “Essa realidade angustiante é propulsora de horas de trabalho, estudo, pesquisas e análises para buscar respostas que possam contribuir com a comunidade de Uruguaiana e região”, declara. A docente acredita que a pandemia ressaltou a importância da enfermagem na gestão de serviços e assistência em saúde, mostrando que são profissionais indispensáveis em momentos de crise.

Usando toda a experiência e o conhecimento em enfermagem, Harter está feliz em poder ajudar. Porém, mesmo fazendo o que pode, assim como Giulia, a cobrança de poder fazer algo prevalece. “Estou motivada em poder estar participando ativamente do enfrentamento à pandemia, e acredito que não poderia observar passivamente esse momento histórico para a saúde e para humanidade, nada mais será como antes. Mulheres que atuam como lideranças políticas mundiais ecoam que podemos juntos combater a COVID-19 e se somam com êxito ao enfrentamento da pandemia, isso é motivador. Acredito que é preciso fazer a nossa parte e contribuir como pudermos para sociedade”, afirma Jenifer.

Comunicação e Informação andam juntas no combate à Covid-19

Na pandemia de COVID-19 percebemos que informação e comunicação são aliadas na hora de prevenir o pânico e orientar como a população deve se proteger. Pensando na importância desses dois fatores no âmbito acadêmico, Cristina Lovato, docente do curso Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia, da Unipampa, em Itaqui, criou o “Jornal Interdisciplinar em C&T”.

No cenário atual, Cristina tem se dedicado aos projetos de ensino, pesquisa e extensão que desenvolve na universidade. Foi ao notar que os alunos necessitavam de um auxílio na leitura e na escrita que ela e uma equipe de docentes, discentes e técnicos dos campi São Borja, Jaguarão e Itaqui decidiram criar um espaço de produção e popularização da ciência. “Temos como eixo orientador a potencialidade de introduzir os discentes na cultura científica a fim de auxiliá-los no desenvolvimento da proficiência em leitura e em escrita. Também tem o objetivo de informar à sociedade, por meio de textos de popularização da ciência, sobre o papel do campus para o desenvolvimento e o crescimento da região da Fronteira Oeste do Estado do Rio Grande do Sul tanto em termos econômicos quanto sociais e humano”, justifica Lovato.

O projeto vem ao encontro da necessidade de combater a desinformação com conteúdos sérios e de qualidade. De acordo com a professora, os estudantes que fazem parte começam a entender mais sobre o funcionamento da ciência e da informação, além de desenvolverem habilidades comunicacionais.

Outra forma de ajudar a informar é o trabalho que a jornalista e mestranda do Programa de Pós-graduação em Comunicação e Indústria Criativa (PPGCIC), Caroline Andrades, faz no perfil no Instagram do Grupo de Trabalho “Unipampa no enfretamento à COVID-19” (@unipampa_COVID-19). Quando uma nova postagem é feita, Caroline realiza as descrições das imagens também conhecidas pela hashtag #pracegover, ou seja, ela deixa as informações mais acessíveis para pessoas com Deficiência Visual. Todas as postagens contam com o texto alternativo, um recurso de acessibilidade comunicativa que utiliza de Inteligência Artificial para ler a descrição detalhada das imagens publicadas no feeed. Assim, as descrições realizadas por Andrades são publicadas como texto alternativo e ficam disponíveis para serem lidas por leitores de tela, como Voice Over do iphone (iOS) e o TalkBack (androide).

Caroline mora em São Borja, cidade onde graduou e hoje segue os estudos na pós-graduação. Foi durante o curso de jornalismo que a estudante se interessou pelo assunto de acessibilidade comunicativa. No Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), ela pesquisou sobre como as pessoas com deficiência sensorial consomem as informações de previsão de tempo nos telejornais.

A descrição das imagens ajuda a ampliar os conteúdos sobre o novo coronavírus para as pessoas com Deficiência Visual, mas para que isso seja efetivo é preciso escutar as pessoas para quem se produz. A jornalista diz que é importante incluir o público no processo, por isso contou com a ajuda de três audiodescritores, dois deles cegos. Para ela, esse contato a fez compreender como descrever melhor sem deixar confuso para os usuários. “No início foi bem difícil, porque eu não tinha muita experiência, então o apoio dos audiodescritores foi fundamental. Eles me orientaram sobre como começar uma descrição, que palavras devo evitar usar, por qual ordem devo começar a descrever uma pessoa. Hoje já consigo fazer a maioria das descrições sozinha”, conta Andrades.

A satisfação do trabalho se dá quando percebe que uma pessoa com deficiência visual que acessar o perfil poderá se informar da maneira adequada. “Quando não disponibilizamos recursos para Pessoas com Deficiência, estamos impedindo-as de exercerem sua cidadania e de consumir notícias de forma independente”, explica Caroline.  

A violência que o isolamento ressalta

A nossa casa é o lugar onde nos sentimos seguros, onde descansamos, cozinhamos nossas comidas preferidas, onde estamos perto da família. Porém, para algumas mulheres estar dentro de casa significa viver com um medo constante da violência, o medo de morrer. Em abril de 2020, a Secretária de Segurança Pública do Rio Grande do Sul registrou um aumento de feminicídios em relação ao mesmo período no ano passado, foram 10 pessoas assassinadas por serem mulheres. No Brasil, mulheres agredidas têm 151,1 vezes mais chances de morrer por feminicídio ou suicídio do que outras mulheres, de acordo com dados do Ministério da Saúde divulgados em 2019.

A preocupação com a vida das mulheres não é só da segurança pública, diversas pesquisadoras têm trabalhando sobre o tema com perspectivas diferentes. É nesse momento que os estudos das Ciências Sociais podem contribuir para debater sobre o tema e evitar que mais casos aconteçam. Marina Landa é uma das pesquisadoras que foca na violência contra a mulher em uma perspectiva da sociologia.

Professora nos cursos de Ciência Política, Direito e Ciências Humanas da Unipampa, em São Borja, Marina estuda temas como democracia, gênero e representação feminina. Durante a pandemia, ela e os colegas realizam lives e seminários para discutir temas da área, entre eles a violência contra a mulher. De acordo com Landa, desvincular o tema violência da questão biológica ajuda a entender a situação como estrutural da cultura, das relações e opressões que existem entre homens e mulheres. Ela também explica que existem mulheres que estão mais expostas à violência do que outras. “Nesse sentido, incluímos fatores que aumentam a vulnerabilidade. Questões como classe, raça, etnia, geração, sexualidade e territorialização operam grandes diferenciais. Não se pode generalizar a mesma forma de opressão para todas as mulheres, assim é importante compreender as condições materiais”, esclarece Marina. Ou seja, dependendo da cor da pele, do lugar em que mora ou das condições financeiras, a mulher pode ter menos ou mais chances de sofrer violência.

A violência contra a mulher vem de uma cultura machista na qual a visão predominante é de que o homem detém o poder sobre elas. É essa visão de sociedade que pesquisadoras como Marina tentam desconstruir através do conhecimento e do diálogo. “A pesquisa pode não ajudar a diminuir o problema de forma direta, mas oferece diversas reflexões sobre a situação para ajudar outros campos da Ciência. Além disso, possibilita o direcionamento para chegar nas mulheres mais atingidas”, conta a professora.

Para ela, a vida das mulheres nunca foi fácil e em situações como a que vivemos o problema fica mais explícito. “A sensação que eu tenho é que sem as mulheres a roda do mundo não gira. Entendo que devemos ficar atentas umas às outras e que devemos ter solidariedade com a situação de outras mulheres,”, desabafa Marina.

O mesmo problema é discutido pela visão jurídica, como faz Waleska Barbosa, colega de Marina no curso de Direito. Como advogada e pesquisadora, Waleska foca seus estudos nos direitos das mulheres. Ela observa que o aumento no número de feminicídios ocorre em razão delas ficarem isoladas com os maridos. “A dependência financeira, o aumento do consumo de álcool, tudo dificulta para que a mulher peça ajuda. Também no início deste confinamento não havia a possibilidade de registro de ocorrência online para esses casos, agora já́ foi disponibilizado”, explica.

As discussões feitas por ela e Marina podem contribuir para que a população fique interessada e ajuda no combate à violência, prevenindo e denunciando. “Cada vez mais as mulheres têm se sensibilizado que qualquer uma de nós está exposta à violência, e, por isso, temos que ter conhecimento para evitar que a violência aconteça”, declara Waleska.

Presenciou algum ato de violência contra a mulher? Conhece alguém em perigo? Não deixe de denunciar, você está ajudando a salvar vidas. A denúncia pode ser feita pelos contatos:

- Emergências 190 (Brigada Militar) e 197 (Polícia Civil)
- Disque-Denúncia 181
- Denúncia Digital 181: ssp.rs.gov.br/denuncia-digital
- WhatsApp (Polícia Civil): (51) 98444.0606
- Escuta Lilás: 0800.541.0803

Gostou da reportagem? Então não deixe de acompanhar o perfil do GT “Unipampa no enfrentamento à Covid-19” no Instagram.

Nesta terça-feira, 16 de junho, às 14h, acontece o Seminário on-line “Faces Femininas na Pandemia”, o evento organizado pelo Comitê de Monitoramento do Coronavírus. As inscrições ocorrem até segunda-feira, 15 de junho, no link.

    • fundo roxo, mosaico com fotos de 9 mulheres. ao lado diz reportagem especial e o titulo da matéria
      Faces do feminino na pandemia de Covid-19